Roberto Eduardo da Costa Macedo, nasceu em Santo Tirso, em 14 de Julho de 1887 e faleceu a 19 de Julho de 1977 no Porto.
Filho de Eduardo da Costa Macedo e de Anastácia Cristina de Azevedo Sanches. Casou com Ana Coelho Hargreaves. Narrou histórias, fez poemas e poesias. Publicou vários livros em prosa e verso, os quais alguns serão citados aqui...

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CHEIA DE GRAÇA

[Obra de Teresa Lobo da Costa Macedo]

I
Pelo sincero amor que me consagras,
tu és formosa e a todas preferida.
Basta que eu tome essas mãozinhas magras,
para que sejas trémula e vencida.

Mais que eu padeces minhas horas agras,
só vives a pensar na minha vida.
E com tantas virtudes tu me sagras,
que subo a perfeição nunca atingida.

Sei bem que às outras cedo a formosura
as deixará. Porém tua amizade,
se nos der vida Deus, tenho-a segura.

Confia unicamente quem perdoa.
E só perdoa, na totalidade,
quem, como tu, Mulher, é meiga e boa.

II
Tombei do meu cavalo, Batalhando.
É, preso por um pé a um estribo,
me vai ele a galope ainda arrastando.
Todos os sonhos de viver derribo.

Naquele sofrimento formidando,
meu próprio sangue entre a poeira libo
e, entre tanto sofrer, ia pensando:
«Ai, meu Amor, que nunca mais arribo!»

Salvei-me por acaso. O rosto horrendo,
braços partidos, crânio sem cabelo
do meu desastre enorme vão dizendo.

Quantos me vêem fogem com horror.
só para ti, Mulher, ainda sou belo.
Não decresceu em nada o teu amor.

III
Sentada junto aos pés da minha cama,
choravas tu, julgando que eu morria;
pois tinham dito médicos de fama
que certamente não escaparia.

Meu corpo ardia em febre que era chama!
E os olhos só a muito custo abria;
porém (fina meiguice de quem ama)
vi-te sempre um sorriso de alegria.

Para não suspeitar da gravidade
do meu estado, vendo-te chorar,
sorrias...mas sofrendo na verdade.

Nem calculas, Mulher, que imenso agrado
me dá lembrar o teu sorriso santo,
esse sincero choro sufocado.

IV
Ceguei. E, desde então, sem ver teu rosto,
senti nascer em ti novas belezas.
Descobri novo, imenso encanto posto
nesse metal de voz em que me rezas.

Palpando as tuas mãos, vivas surpresas,
nova fortuna achei para meu gosto.
- Olhai: A treva como tem riquezas,
que vós não compreendeis, oh, não, aposto!

Um, sol de cá de dentro me ilumina.
Diviso e cinjo a graça etérea, alada,
que nunca a luz do dia descortina!

Com a doce e gentil realidade
com que te via outrora, minha amada,
agora sei olhar tua amizade.

V
Quem diz que é cego o amor vilipendia.
Ele é artista de alta inspiração.
Desenha e esculpe, à luz, em pleno dia,
o encanto, o elenco, o sonho, a sedução.

Em ti, Mulher, há divinal magia,
doce atrativo que não tem irmão:
- A luz que de mim mesmo se irradia,
o sol do amor, o fogo da ilusão.

Doce mentira ou mística verdade,
do peito mais gelado conhecida,
é a chama de amor, que nos invade.

Acredita, Mulher, é isto assim:
Para que sejas bela nesta vida,
basta que tu sejas para mim.
Santo Tirso, 1916
[Obra de Teresa Lobo da Costa Macedo]

O ARTISTA

[Obra de Teresa Lobo da Costa Macedo]

Capitalista
de sentimento
e pensamento
- eis o ARTISTA
viva ambição
de execução
com materiais
de seus ideais
é a tortura
em que se apura
Sonhar, achar,
amar, criar
é a aventura
que ele procura.
É na oficina,
dessa alma fina,
que, noite e dia,
com alegria,
que amor ateia,
se lavra a Ideia.
Fafe, 1940

AMOR CONJUGAL

Aquela que diviso nos meus sonhos,
que desenho de cor, de olhos fechados,
que foi meu par nos dias mais risonhos,
que nunca me deixou nos desolados,

Aquela que esperei como Jacob,
nos moldes ao sabor do meu ideal,
graças à qual não fui, no mundo, só,
sem um amor ao meu amor igual,

Aquela que anda tão ligada a mim,
como anda a terra devotada ao mar,
a ponto de fusão, formando, assim,
o globo, o todo, aquilo que era par,

Aquela cujo corpo ao meu lado unido,
é astro global procriador,
de luminosa auréola revestido,
atmosfera de sonhos e de amor,

Jamais de mim, nem só por um momento,
será de corpo ou de alma separada,
enlaça-nos o mesmo pensamento,
percorrer, no Infinito, a mesma estrada.

Quando a cinza dos corpos for misturada,
em que não possa já haver destrinça,
errarão nossas almas pela altura,
campo que Eterno Deus de estrelas inça.
Vila do Conde, Julho de 1967

VENUS IMACULADA

[Obra de Teresa Lobo da Costa Macedo]

Rompi-lhe as vestes negras, abafadas,
primeiro o cisne colo desnudando
e logo os ombros de contorno brando
e o seio casto e as pomas delicadas...

Lembravam minhas mãos as Madrugadas,
quando o noturno manto vão rasgando;
e como é bela e pura a Lua quando
se mostra nua às Noites recatadas!

Assim a Terra é pelo Sol despida;
não há pecado nos milhões de beijos,
beijos de luz que despertam nela a Vida.

É puro o pólen que fecunda a flor;
são sempre imaculados os desejos,
se existe neles verdadeiro Amor.
Coimbra, Junho de 1911

A MENTIRA

[Obra de Teresa Lobo da Costa Macedo]

Com seus pomposos vestidos,
mentira parece um astro
dos mais esclarecidos
e, contudo, tem cadastro;

Tem tal arte a feitiçaria,
tão bem se pinta e afina,
parece ingénua menina.

Se for preciso discurso
sobre importante matéria,
Mentira vem ao concurso
com ar de «senhora séria»;

mas também se não atriga,
se lhe convém a maneira,
de usar navalha na liga
e pistola na algibeira.

Este jeito tão agudo
tornou-a célebre atriz:
Mentira se presta a tudo
e em tudo mete o nariz.

Verão a fé que ela inspira,
afirmando à gente nova
que se engana, que é mentira
o que Mentira reprova.

Digam lá ao poderoso,
a quem ela lisonjeia
e cativa e traz baboso,
que seja a Mentira feia!

Se lho dizeis, sois corridos,
alcunhados de intrigantes,
de patifes, de vendidos,
de pandilhas, de tratantes.

Mentira, Calúnia, Intriga,
Lisonja ou Hipocrisia
são capas em que se abriga,
mantos com que se atavia.

A Mentira é cadastrada,
usa vários apelidos,
sempre bem caraterizada,
sempre a mudar de vestidos!

Tem modos de regateira,
usa navalha na liga
e pistola na algibeira?
É a Calúnia, A Intriga;

Vem de carinha de santa,
de voz meiga e fala pia
e de ternura que encanta?
Chama-se a Hipocrisia.

Mentira sabe viver,
com jeito viver procura;
é amante do Poder
e dá o braço à Fartura.

Mentira tira partido
do seu engenho matreiro,
tal como o lobo vestido
com pele de cordeiro;

É coxa, se ouve dizer,
mas, quando se põe a andar,
nem sempre, mesmo a correr,
ela é fácil de apanhar.

Lá vem um dia a Ciência,
de imortal tenacidade
e de invencível paciência
e proclama a Verdade.

Muitas vezes a Verdade
mora nos mais altos Céus,
não desce à Humanidade,
é privilégio de Deus;

Então aí a Mentira,
achando-se sem rival,
traça, volta, risca, gira,
orgulhosa e triunfal.

Mentira diz triunfante:
«Mentira existe, logo há-de
(Mentira comediante!)
ser a Mentira...Verdade».

Mentira consome a vida
a fingir ser a Verdade
é como mulher perdida
a aparentar castidade.

Mentira toda se vira,
Mentira toda se ajeita,
Mentira toda se enfeita,
mas fica sempre Mentira.

Mentira toda taful,
Mentira toda aparência
é de incógnita ascendência
e afirma ter sangue azul.

Se acaso lhe perguntais,
ao vê-la passar ligeira:
- «Ó Mentira, onde é que vais?»
responde toda lampeira:
- «Vou a casa de meus pais».

Tem sete filhos Mentira,
filhos bem originais;
Estes filhos da Mentira...
...são os pecados mortais.


[Obra de Teresa Lobo da Costa Macedo]

ZERO

[Obra de Teresa Lobo da Costa Macedo]

Quero,
gero,
mando,
impero,
vou somando
e acho: - ZERO
..........................
..........................
Zero, ovo,
mundo novo,
ventre que gera a unidade,
fonte de toda a verdade,
ponto fiel da balança,
equilíbrio, temperança.